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21/04/2020ㅤ Publicado às 20:02




Arquitetos e urbanistas brasileiros e estrangeiros falam sobre seus vínculos com a Capital

No aniversário de Brasília, 21 de abril, o Conselho de Arquitetura e Urbanismo do Distrito Federal – CAU/DF presta a sua homenagem à Capital Federal com a participação de conceituados arquitetos e urbanistas do Brasil e do Exterior. Cada um deles enviou vídeos com depoimentos sobre a cidade e alguns deles revelaram um forte o vínculo afetivo e emocional com a cidade.

O arquiteto e urbanista Gustavo Penna tem sua história pessoal interligada com a de Brasília. “Meu pai foi pioneiro. Ajudou a construir o Catetinho, palácio de tábuas feito em uma semana”, recordou. Penna definiu Brasília como a “cidade dos horizontes mágicos, construída para ser símbolo da inventividade brasileira”.

O arquiteto e urbanista Angelo Bucci destacou a importância do projeto da capital federal e como ele foi apresentado por Lúcio Costa, com clareza e modéstia. “Uma coisa tão brasileira, que é poder apresentar um projeto dessa importância começando por um pedido de desculpas sem que isso seja lido como um demérito à proposta”, lembrou.

Ao se falar em projeto arquitetônico, o arquiteto e urbanista Álvaro Puntoni destacou os projetos que elaborou e executou na cidade, como a sede do Sebrae Nacional construída há dez anos. “Foi um sonho realizado em Brasília”, resumiu a experiência.

Sonho esse que o crítico, curador e professor da FAU/USP, Guilherme Wisnik traduziu como a ideia de um mundo melhor. “A radicalidade dos espaços das superquadras, um conjunto de lugares que você atravessa a pé, de uma transparência sem bloqueios, é uma espécie de miragem de um mundo mais socializado e mais fraterno que se pensou possível e foi realizado em Brasilia (…), e que ainda pulsa”, resumiu o arquiteto e urbanista.

O arquiteto e urbanista Bruno Santa Cecília por sua vez, lembrou dos espaços generosos e do “chão público” da cidade (que não é de ninguém, mas é de todos). Segundo ele, “Brasília é uma das grandes invenções do século XX, não apenas no campo da arquitetura e do urbanismo, mas no âmbito de todas as invenções humanas”.

Percepção semelhante de espaço tem o arquiteto peruano Jean Pierre Crousse. Além do valor sentimental – seu pai foi um dos arquitetos que atuaram na construção da Embaixada do Peru no final dos anos 60 –, Brasília é um grande exemplo de generosidade. Ao fazer o solo contínuo, livre e transparente fez da capital, um dos experimentos mais importantes do urbanismo latino-americano no mundo. “Brasília foi a vanguarda da arquitetura latino-americana”, conclui Crousse.

O arquiteto paraguaio Javier Corvalan compartilha da opinião de Crousse e citou o amigo e também arquiteto Rafael Iglesias para definir Brasília. “Ele diz que, na Latinoamérica, somos mais geográficos que históricos. Com seu Plano Piloto, Brasília é, sem dúvida, a tese mais concreta dessa hipótese”, reforçou Corvalan.

Seu conterrâneo, o arquiteto de Assunción, José Cubilla, é também um admirador da capital federal e resumiu Brasília como resultado da visão e do talento de arquitetos, engenheiros, artistas e de vários outros profissionais que concretizaram essa missão. “Quem não conhece a marca do território, seus espaços urbanos, com o lago ao redor e seus lindos monumentos?”, questionou.

DESAFIOS

“Gosto de pensar no caráter fundacional de Brasília. A cidade criada a partir do nada. Brasília surpreendeu o mundo!”. Essa é a definição de Brasília dada pelo conselheiro do Conselho de Arquitetura e Urbanismo do Pernambuco (CAU/PE), Marco Antônio Borsoi.

Sob o ponto de vista da arquiteta e urbanista Raquel Rolnik, Brasília transcende a fascinação por sua arquitetura. Representa uma ruptura que pode ser vista em várias escalas. A principal delas, conforme pontua, é que sua inauguração fez parte de um projeto geopolítico de integração; de um mercado nacional de expansão da agricultura e das atividades mercantis. “Representa a forma de ocupação do território como jamais havia conseguido interiorizar e integrar numa perspectiva nacional. Portanto, Brasília é, ao mesmo tempo, ruptura e absolutamente continuidade”, complementou.

E é justamente essa continuação que preocupa alguns arquitetos e urbanistas, pois junto a ela vem os desafios a serem enfrentados. Para João Belo Rodeia, arquiteto e urbanista português, o maior desafio da Brasília atual é “dar continuidade a essa hipótese de cidade moderna, alargando-a a todos os que vivem em suas periferias, entregando-lhes a continuidade do Plano Piloto e idêntica qualidade do ambiente construído”.

A arquiteta e urbanista Elisabete França – que se dedica às políticas urbanas para melhorias das cidades – lembra que Brasília é resultado de um projeto de Lúcio Costa para 500 mil habitantes e, atualmente, existem mais de quatro milhões de moradores. E por essas e outras razões, além de representar o urbanismo moderno, Brasília é também referência de lições aprendidas. “Como resolvermos essa precariedade urbana? Como nós arquitetos e urbanistas podemos contribuir para solucionar essa dramática situação urbana em que vivemos?”, questionou.

Apesar de todos os problemas sociais e geográficos consonantes a uma capital do porte de Brasília, a capital federal continua atraindo os olhares daqueles que passam a conhecê-la. “Gostaria de parabenizar essa senhora de 60 anos que continua nos encantando e oferecendo ao mundo, possivelmente, a experiência de urbanismo mais incrível e mais completa para a humanidade”, encerrou o arquiteto e urbanista brasileiro, Roberto Moita.

ASSISTA TODOS OS VÍDEO-DEPOIMENTOS DOS
ARQUITETOS E URBANISTAS SOBRE O ANIVERSÁRIO DE BRASÍLIA.

O presidente do Conselho de Arquitetura e Urbanismo do Distrito Federal – CAU/DF, arq. Daniel Mangabeira, também expressou o seu encantamento na mensagem a seguir:

Brasília de 60 fez 60

Para falar de Brasília utilizarei o conceito de cidade polinucleada de Aldo Paviani. O Plano Piloto é o centro da cidade, nosso centro histórico, nosso perímetro urbano protegido no meio do cerrado, nosso porto seguro.

Escrever sobre essa cidade aberta, sem cercas, com espaços generosos, utopicamente livre e democrática em tempos de pandemia, tornou-se um exercício de sociologia. Brasília e quarentena são antagônicas. Esta cidade não foi inventada para moradores em clausura. Obviamente nenhuma foi pensada para tal, mas o Plano Piloto tem particularidades que tornam a reclusão a antítese do que ela foi pensada para ser. A celebração dessa cidade imaginada e real faz-se imprescindível em tempos de confinamento, principalmente porque Brasília funciona como um contraponto às desigualdades espaciais das cidades brasileiras.

Erguer uma capital tem enorme força na história das civilizações, mas criar civilidade tem peso maior no desenvolvimento dessas civilizações. O respeito à faixa de pedestres no Brasil começou em Brasília; aqui evita-se buzinar; ceder espaço em um engarrafamento é comum; os blocos cuidam dos jardins públicos frontais; a lei do silêncio funciona; o Paranoá é um dos poucos lagos urbanos limpos no País e por aí vai.

Dentro da área protegida, uma utópica, rígida e imutável equidade socioespacial exacerba uma enorme desigualdade socioeconômica presente fora da área tombada. Enquanto os acolhidos em suas moradias do plano piloto, rodeados por seus vastos gramados verdes promulgam a introspecção e convidam a olhar para dentro de si, faz-se necessário o inverso, a enxergar o que está do lado de fora, para além do que nos cerca. Não o nosso vizinho, mas aquele que está mais acolá, que não tem uma grama após a calçada, que não tem um parque na porta da casa. O abismo de qualidade espacial que existe entre a vazia Brasília e as muradas cidades ao seu redor, precisa ser diminuído. Nada melhor do que um aniversário para presentearmos quem sempre nos resguardou! Cuidar das cidades vizinhas será o maior presente que daremos ao Plano Piloto de Brasília em seus 60 anos!

Precisamos entender como o espaço desocupado nas cidades é necessário e começarmos a imaginar cidades menos claustrofóbicas, menos centradas na menor distância entre o trabalho e a casa, mas na qualidade espacial que separa o trabalho da casa. Este momento atípico e surreal na saúde e na política brasileira pode servir para diminuirmos o precipício qualitativo entre as cidades do DF.

No século 14 a praga bubônica modificou drasticamente a sociedade, as cidades e a economia medieval. Agora, nós arquitetos e urbanista temos o dever de rediscutir o planejamento de nossas cidades abordando novamente a salubridade dos espaços construídos. Devemos celebrar o Plano Piloto de Brasília sim e mais do que nunca mostrarmos que as boas ideais da nossa cidade não podem continuar a ser privilégio de poucos. Como dizia o professor Lucio, “a melhor forma de prever é olhar para trás” e Brasília ainda tem muito a ensinar! É necessário rediscutir a importância de amplos e generosos espaços públicos e fazer com que outras cidades entendam que não estamos falando de beleza, mas de saúde! A amplidão a que me refiro não é a monumental, mas a presente na generosidade da escala residencial, porque é nela que a cidade pulsa. O tributo aos 60 anos da cidade ocorrerá nas superquadras livres, sem cerca, sem muros e não na Praça dos Três Poderes com seus prédios cercados, isolados e com seus espelhos d’água que infelizmente mais afastam do que aproximam.

Parabéns Brasília! Parabéns Lucio Costa, Oscar Niemeyer, Juscelino Kubitschek, Joaquim Cardoso, Ítalo Campofiorito, Anísio Teixeira, Marianne Peretti, Darci Ribeiro, Athos Bulcão, Lelé, Mayume Watanabe, Bernardo Sayão e tantos outros anônimos homens e mulheres que ergueram a face moderna da nossa história! Obrigado por nos mostrar a importância da democracia, educação, crítica, inovação, ousadia e da soberania do espaço público amplo e irrestrito para a qualidade de vida da população! Que os próximos 60 anos sejam marcados pela resiliência, paz, generosidade, beleza e respeito que você sempre nos proporcionou!

Arq. Daniel Mangabeira da Vinha
Presidente CAU/DF

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