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16/09/2015ㅤ Publicado às 19:55

Em época de derrubadas de construções irregulares e de manifestações de repúdio a órgãos de fiscalização, o superintendente do Instituto do Patrimônio Histórico Cultural do Distrito Federal – Iphan-DF, arq. urb. Carlos Madson (foto), propõe que seja estabelecido convênio com o Conselho de Arquitetura e Urbanismo do Distrito Federal – CAU/DF para que as intervenções realizadas em áreas tombadas sejam fiscalizadas com maior intensidade. “Boa parte das descaracterizações de obras tombadas, sobretudo de edifícios residenciais cuja arquitetura data da década de 60 e 80, estão sendo descaracterizadas, em sua maioria, por arquitetos e urbanistas. Nesse caso, não sabemos se são profissionais habilitados, e é nesse ponto que a participação do CAU/DF se torna fundamental, pois tem a competência de fiscalizar o exercício profissional”, afirmou Carlos Madson.

O objetivo, segundo ele, é que os dois órgãos atuem em conjunto, trocando informações e debatendo os casos que surgirem, bem como do respeito ao patrimônio. “Embora não estejam tombados individualmente, esses prédios fazem parte de um conjunto urbanístico, o qual deve ser protegido”, esclarece Carlos Madson.

Em recente entrevista concedida ao CAU/DF, o superintendente do Iphan-DF registrou a intenção de parceria com o Conselho, com o objetivo de que, juntas, as duas entidades possam impedir, por exemplo, que condomínios residenciais e comerciais alterem a arquitetura de edifícios que fazem parte história da cidade. O superintendente citou, como exemplo, as modificações de fachadas realizadas em quadras consideradas “modelos” em Arquitetura, como é o caso das SQS 105, SQS 107/108 e SQS 208, no Plano Piloto.

Confira, a seguir, a entrevista completa e o que o superintendente do Iphan – DF pensa sobre algumas questões em discussão atualmente:

CAU/DF – Como a parceria entre o Iphan-DF e o CAU/DF poderá ajudar na preservação da arquitetura e do urbanismo da cidade?

Arq. Urb. Carlos Madson – Nós temos um trabalho muito importante para ser feito em conjunto que é a questão da fiscalização das intervenções em áreas tombadas. Nesse caso, caberia identificar, no que compete ao CAU/DF diretamente, quem está fazendo essas obras: se são profissionais habilitados ou não. Em um segundo momento, podemos discutir a qualidade dessas obras. Boa parte das descaracterizações de áreas tombadas, está sendo feita por arquitetos e urbanistas. Nossa intenção, é mobilizar outras entidades, como o Instituto dos Arquitetos do Brasil – IAB, com o intuito de reforçar esse trabalho de resgate da identidade da capital federal.

CAU/DF – E o que falta para iniciar essa parceria?

Arq. Urb. Carlos Madson – Falta apenas articulação entre as entidades e os órgãos do Governo do Distrito Federal (GDF), até porque esse trabalho conjunto teria um custo baixíssimo para todos. Vou dar um exemplo: os professores do curso de Arquitetura e Urbanismo da Universidade de Brasília (UnB), Sylvia Fischer e Pedro Paulo Palazzo, se colocaram à nossa disposição para realizar um curso sobre os paradigmas da arquitetura moderna em Brasília, no qual poderemos discutir os parâmetros urbanísticos e os desenhos da cidade. O tema faz parte de uma pesquisa que a arquiteta Sylvia realiza há muito tempo e que precisa extrapolar o meio acadêmico. Trata-se do conteúdo de um curso de especialização, que é caríssimo, mas que seria sem ônus para nós. Em um segundo momento, poderíamos agendar uma série de palestras sobre os cuidados que, nós, arquitetos e urbanistas, devemos ter com o patrimônio arquitetônico e urbanístico ao elaborarmos um projeto de alteração de fachada de um edifício residencial, por exemplo.

CAU/DF – E como melhorar essa articulação com os órgãos do GDF?

Arq. Urb. Carlos Madson – Atualmente, temos um acordo de cooperação de trabalho conjunto de gestão, que é inédito no Distrito Federal, o qual propõe que a Secretaria de Estado de Gestão do Território e Habitação – Segeth, Secretaria de Estado de Cultura do Distrito Federal – responsável pelos imóveis tombados, como o Teatro Nacional – e a Agência de Fiscalização do Distrito Federal – Agefis fiscalizem o espaço tombado. Para isso, seguimos um plano de trabalho e se formou um GTE – Grupo Técnico Executivo, formado por servidores desses órgãos. A cada 15 dias, esse grupo se reúne ordinariamente, cabendo ao GTE fazer recomendações com base em análises técnicas, como o plano de ocupação do Parque da Cidade. No entanto, ele precisa se fortalecer; ter uma interação maior.

CAU/DF – Gostaríamos de ouvir a sua opinião sobre algumas questões que estão em discussão recentemente. Vamos aos temas:

MOBILIDADE URBANA

Arq. Urb. Carlos Madson – Hoje, a rodoviária do Plano Piloto recebe cerca de 700 mil pessoas por dia, em uma cidade que estava planejada para 500 mil. O local recebe uma linha do BRT (sul), ocupando um lado inteiro de uma plataforma. No futuro, chegarão mais três linhas do BRT (norte, leste e oeste). Onde iremos colocar essas pessoas? Hoje, a rodoviária não sustentaria. O plano de transportes do DF está sendo feito aos pedaços e não sabemos como isso tem sido realizado. Sabemos que o governo é formado por várias representações e a falta de coesão e articulação entre elas é muito séria. Fizemos uma reunião para discutir a obra de reforma da rodoviária. O Iphan foi quem convocou e promoveu a reunião. Foram chamados a Casa Civil, a Segeth, o DFTrans, a Secretaria de Estado de Turismo do Distrito Federal e a Companhia Urbanizadora da Nova Capital do Brasil – Novacap, que desconhecia a Segeth. Ninguém conhece ninguém e não conversam entre si, em um projeto dessa magnitude.

MURETA NO EIXÃO PARA REDUZIR RISCOS DE ACIDENTES

Arq. Urb. Carlos Madson – O Departamento de Estradas de Rodagem do Distrito Federal (DER-DF) voltou com a história de colocar mureta no Eixão para evitar acidentes no local e fomos consultados pelo órgão sobre o assunto. O Iphan não tem competência para administrar estrada. O que advogamos é que aquela via não é mais estrada há muito tempo; é urbana e tem que ser tratada como tal. Portanto, a mureta não resolveria em nada, pois é um recurso utilizado em estradas e irá segmentar ainda mais a cidade sem resolver o problema. O problema maior do Eixo é a velocidade com relação ao pedestre que não tem opção: ou se arrisca nas passarelas subterrâneas ou atravessam a via por cima. Só que vale ressaltar que, em 55 anos, as passarelas subterrâneas nunca funcionaram. Elas são mal resolvidas arquitetonicamente, inseguras e com uma distância muito grande a se percorrer, além de romper a lógica de andar do ser humano – ele não anda por debaixo da terra, mas no nível. Plataforma subterrânea escondida não funciona em lugar algum do mundo. Na Holanda, por exemplo, elas são sujas, dá medo passar e olha que lá tem uma segurança melhor. A sociedade é menos violenta e tem uma densidade maior. Aqui não tem. Passa uma pessoa ou outra em certos horários, como de manhã para trabalhar. Fora desse período, não existe fluxo de pessoas.

UNESCO X PPCUB

Arq. Urb. Carlos Madson – A discussão do Plano de Preservação do Conjunto Urbanístico de Brasília – PPCUB está parada. Ela já deveria ter sido retomada pelo Governo nesse segundo semestre, o que não ocorreu. O relatório de monitoramento da Unesco solicita que, no começo do ano de 2016, o Iphan faça um novo relatório sobre o andamento do PPCUB. Na última visita a Brasília em 2015, eles deixaram uma série de recomendações, com destaque para três: 1) o PPCUB; 2) a integração entre os governos local e federal, e 3) a complementação da nossa Portaria n° 314, que regulamenta as intervenções do conjunto urbanístico de Brasília, determinando as diretrizes de 1992. Neste caso, o Iphan tem feito a revisão e a complementação dessa portaria que aprova as definições e os critérios para intervenções do conjunto urbanístico da cidade. Até o final do ano, esse trabalho deverá estar pronto. Quanto ao PPCUB, no relatório enviado pelo Iphan no início de 2015, respondemos à Unesco que o Plano havia sido interrompido por conta da mudança de governo: que o Brasil é um país completamente diferente, pois temos processo eleitoral a cada quatro anos e que mudou o governo, que tem outras prioridades, e o projeto ainda não foi aprovado na Câmara Legislativa. Já com relação à articulação entre governos, em março de 2015 assinamos um acordo de cooperação técnica com a Segeth, que está vigente, para a gestão compartilhada da área tombada, com a finalidade de discutir em conjunto todas as intervenções.

PISCINÕES

Arq. Urb. Carlos Madson – Existe um projeto complexo em discussão, que iremos envolver o CAU/DF. Trata-se do plano de drenagem da área tombada, onde querem construir uns cinco piscinões. Existe um projeto o qual o Iphan está analisando, que pretende tornar 3% da área do Parque Burle Marx em um grande piscinão, a exemplo do que existe no parque da Cidade e no Setor de Clubes Norte. Revisitamos esses locais, e reafirmamos que os piscinões são horríveis e não resolvem a questão. Esse é um recurso de drenagem de águas, segundo os especialistas, já superado, até porque temos em Brasilia diversas áreas verdes livres para a absorção de água. Os piscinões são espaços degradados, sujos, que ninguém faz manutenção. As técnicas modernas de hoje mostram a microdrenagem, a qual dá uma capilaridade maior, que é o que defendemos. O que falta é termos um projeto que contemple e respeite isso. Estamos programando um seminário com dois especialistas de São Paulo e um da Universidade de Brasília (UnB) que irão mostrar que o piscinão é um projeto totalmente inadequado para a capital. Queremos discutir o tema e propor ao governo novas soluções, inclusive mais baratas, que beneficiem o patrimônio, que é isso que o Iphan busca.

INSTITUTO DE PLANEJAMENTO URBANO

Arq. Urb. Carlos Madson – A capital do país não ter um órgão central de planejamento urbano é um absurdo no estágio de desenvolvimento em que estamos. Precisamos de um instituto de planejamento urbano da cidade. A Secretaria de Planejamento atual cuida de recursos e impostos. A Segeth executa as políticas urbanas. O Instituto seria um órgão de planejamento urbano. O Iphan não executa política urbana; não é competência da União, ou seja, do Iphan. É dos Estados e municípios. A União dá diretrizes, define leis, mas a execução é, no caso, do Distrito Federal. Mas a proposta do governo em criar o Instituto de Planejamento Urbano foi postergada por questões políticas; não interessa muito.

COMPETÊNCIA DO IPHAN

Arq. Urb. Carlos Madson – O Iphan pode embargar uma obra, desde que seja uma infração ao bem tombado. Em 90% dos casos que ocorrem em Brasília não são. Estamos tentando esclarecer qual o papel do Iphan neste tombamento. Transporte urbano, por exemplo, não é nossa atribuição, mas opinamos sobre como esse transporte se insere na cidade tombada. Podemos fazer um paralelo, por exemplo, como o CAU/DF. É ótimo que o Conselho participe da formação dos arquitetos e urbanistas e discuta as diretrizes curriculares, mas não é atribuição do CAU ver como o professor está dando aula ou fiscalizar uma escola de arquitetura, por exemplo. O Iphan também não é o gestor do espaço urbano.

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